Sugestão disruptiva e inclusiva para empresas: voltar a pensar no cliente
- Gustavo Sette
- 30 de jun. de 2022
- 4 min de leitura
Um dos maiores desafios da gestão empresarial é equilibrar os diversos temas, projetos e expectativas trazidas pelo ambiente interno e externo, e alguns desses pratinhos a equilibrar são os “temas da moda”. O problema que estamos vivendo hoje é que muitas empresas estão tão preocupadas em “bater todos os pênaltis” da moda que estão esquecendo de fazer o básico bem-feito, e isso não costuma dar certo.

Usando exemplos dos últimos anos: inovação e disrupção tech, novo normal e outras da pandemia, ESG + inclusão + transição climática. Todos são temas importantes, mas tornaram-se causas com viés excludente e julgador, sempre com uma roupagem padrão de “o assunto XXX ganha importância e QUEM NÃO se entregar a ele será excluído do mercado”. Surgem palestras, congressos, especialistas e novas tendências, que se tornam um mercado em si.
Sempre olhei para os temas do momento com um certo pragmatismo: importante entender o tema, ler o que tem que ser lido, buscar o que vale ser testado na empresa e, eventualmente, colocar alguém bom dedicado ao assunto, mas JAMAIS perder o foco no que a empresa tem que fazer.
O que vi lá por 2017 com a histeria da inovação foi muito curioso para quem começava a olhar o mercado com olhos de consultor. Negócios estruturados e antigos cancelando convenções de vendas tradicionais, pois as datas conflitavam com alguma pregação imperdível da bola da vez, a Singularity University (ouvi muitos “quem não for, vai ficar de fora”). Vi dono de rede de varejo preocupado porque leu que os carros iriam voar dali a 5 anos (que é 2022). Agricultor vendendo terras centenárias para comprar startup, afinal, a promessa era que 90% dos negócios seriam varridos pela inovação em menos de 5 anos.
Com a pandemia, veio o “novo normal”, home office e mais uma vez a promessa de que 90% da forma de fazer negócios mudaria... Na época escrevi e recomendei: foco total no caixa, em cuidar das pessoas da empresa e de suas famílias e fazer rápidas adaptações que a pandemia exige ao seu negócio.
Vivemos agora a onda da inclusão, do ESG, do meio ambiente, da transição climática e, mais uma vez, temas superimportantes ganham uma roupagem apelativa e excludente: quem não fizer está fora, é do mal, não vai sobreviver. Como esses são temas tipicamente de governo, a confusão é ainda maior, pois meio que obriga o empresário a entrar na perigosa discussão política, em um mundo cada vez mais binário.
O problema é que a vida é feita de escolhas. Com essa histeria para bater as metas de parecer ser moderno e “do bem”, muitas empresas estão deixando o básico de lado e desviando o foco de seu objetivo social para pautas típicas de governo e ONGs, em que a empresa não tem conhecimento. Já não são poucos os exemplos de companhias que se deram mal associando a sua marca a temas que não domina.
Em meus anos de consumidor, não me lembro de ter sido tão mal atendido como nos dias de hoje. De uma hora para outra, as empresas, que tanto falam em inclusão, decidiram ELIMINAR o canal direto entre empresa e cliente, e andaram para trás em interface e usabilidade nos canais digitais. Atividades como comprar, pagar, alterar, reclamar, tornaram-se verdadeiras torturas. Tudo está mais demorado, burocrático e confuso.
O alerta é importante pois, um dia, chega o boleto da chamada “bigorna da realidade”. Em tudo ligado a negócios, uma hora ou outra o fundamento prevalece. Agora que o dinheiro do mundo ficou mais caro, as startups que não dão lucro estão sendo eliminadas. Muitas empresas com discurso inclusivo e sofisticado estão comunicando demissões de centenas de pessoas, do dia para a noite.
A vida do “home office” causará mudanças, mas não será como previsto nas lives durante a pandemia. Estamos em um momento de desequilíbrio da força de trabalho, com mais vagas do que empregados, mas assim que isso se ajustar, a realidade vai se impor. Mesmo na transição climática estamos vendo um movimento curioso de adequação à realidade. Sem a energia limpa que bate as metas climáticas, muitos países estão religando minas de carvão, pois o inverno vem aí, e viver em Estocolmo em dezembro sem aquecimento é a realidade se impondo.
Li esse mês uma pesquisa da Fortune com os CEOs das 500 maiores empresas americanas, e uma das perguntas era: os CEOs devem se posicionar em causas sociais e políticas? Para 72% dos CEOs, é hora de dar um passo atrás pois já se envolveram demais e é preciso voltar a olhar para o negócio.
Empresas e profissionais precisam fazer primeiro o que vem primeiro: o básico bem-feito. Erradicar a pobreza e preservar as florestas são pautas muito importantes, mas antes de resolver o mundo, a padaria precisa fazer um bom pão, a indústria precisa produzir com qualidade e eficiência, o setor de serviços precisa atender bem o cliente.
Não vejo nada mais importante em termos de inovação e inclusão do que voltar a atender bem os clientes, dar voz aos clientes. Não precisamos nem voltar ao antigo termo “encantar”, basta cuidar do básico, que foi abandonado.
Há uma velha frase, provocativa, que diz que os jovens devem arrumar os quartos antes de tentar arrumar o mundo, e aqui cabe a mesma reflexão. As empresas precisam arrumar seu planejamento, sua visão, suas finanças, a relação com os clientes, o produto, os canais, os processos internos e as suas pessoas antes de arrumar o mundo, e é essa a minha abordagem como consultor, ajudando as empresas e seus profissionais. Os ofendidos podem não gostar, mas uma empresa que entrega o que promete, paga seus impostos, fornecedores e funcionários já está fazendo bastante pela sociedade.
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