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  • Gustavo Sette

Resumo da Harvard Business Review mar/abr 2024: crescimento, IA, envelhecimento e mais

Ler revistas de negócios serve para mim a um duplo propósito. Em primeiro lugar, busco aprender sobre as discussões dos grandes pensadores do mundo empresarial, embora sejam raríssimas. Em segundo lugar, tento antecipar e filtrar os modismos e ruídos criados por essas publicações para promover livros, palestras e consultorias para empresas. Parte do meu trabalho envolve auxiliar os executivos a discernirem entre o que é apenas ruído e o que realmente faz sentido para o contexto em que estão inseridos.


Apesar do atual momento desafiador para a reputação das grandes escolas americanas, especialmente Harvard, a Harvard Business Review ainda se destaca como uma leitura interessante para mim.


A seguir, apresento um breve comentário sobre os temas que mais me chamaram a atenção na edição de março e abril de 2024. No final, trago 5 provocações sobre a edição.



Assunto de capa: quão rápido a sua empresa deve realmente crescer?


Adorei o assunto da matéria de capa, pois traz um questionamento que faço há alguns anos a empresários: por que a sua empresa quer crescer no ritmo que definiu crescer? E como ela vai crescer?


Costumo usar a provocação de que empresas quebram geralmente crescendo, mas o artigo da Harvard traz algo novo e ainda mais provocador: menos de 5% das empresas americanas conseguem manter um ritmo sustentável e longevo de crescimento.


É claro que não sou contra uma empresa querer crescer. O que eu questiono é a panaceia, o discurso único e pouco profundo de que toda empresa precisa crescer muito e muito rápido em todas as situações.


O artigo pontua: crescimento é uma decisão estratégica que tem consequências para a empresa em operações, finanças, pessoas, estrutura e cultura. O autor traz uma série de exemplos de empresas que decidiram crescer de forma mais lenta e estruturada, com excelentes resultados.


Muita empresa tira um número da cabeça, um sonho, uma necessidade, uma vaidade... Vamos crescer 25% ao ano. Já o artigo diz que, para crescer, você precisa escolher um caminho: aumentar a escala nos mercados que já atua, aumentar o escopo em produtos e serviços adjacentes ou diversificar para novos mercados.


O artigo me lembrou do conceito de “marcha das 20 milhas”, de Jim Collins no seu livro “Great by choice” de 2011, e de um livro desconhecido que tenho recomendado bastante chamado “Small Giants: Companies That Choose to Be Great Instead of Big”, de Bo Bulingham, 2016, não traduzido para o Português.


Somando esses conceitos aos dados trazidos pelo autor, podemos concluir que a imensa maioria das empresas não consegue crescer de forma consistente, portanto, sem um motivo e uma estratégia que justifique buscar tanto crescimento, talvez uma forma de se diferenciar seja agir como espectador dos concorrentes transpirando nessa obsessão. Vão errar mais, vão testar mais coisas que vão dar certo e errado e, daqui a 10 anos, uns 90% terão crescimento abaixo da inflação. Deixe os concorrentes baterem todos os pênaltis e copie mais rápido o que deu certo. Você não vai pegar toda a alta do que deu certo, mas não vai ter que pagar pelo que deu errado para chegar ao certo.


Assunto mais útil para gestores: negociação e escuta


Um executivo com ampla experiência em negociação de sequestros e extorsões em diferentes partes do mundo traz algumas reflexões sobre o que funciona em negociações.

E fico feliz por ele ter dito que a ferramenta mais importante é a escuta. “A única forma de mover alguém em sua direção é ouvir profunda e empaticamente, garantindo que a outra pessoa sinta-se vista, ouvida e entendida”. A partir daí o autor faz um roteiro do que ele chama de “escuta nível 5”, para o qual ele propõe 8 ferramentas, que vou traduzir e compartilhar com mentorados.


Assunto mais impactante: redesenhando a aposentadoria


O artigo é impactante pelo gráfico que mostra o crescimento projetado da força de trabalho por faixa etária nos EUA nos próximos 10 anos. É assustador! Enquanto a população de 16 a 34 anos vai cair, a população acima de 65 vai crescer 34%!



O artigo discute os desafios enfrentados pelas empresas devido à escassez de talentos e à aposentadoria iminente de muitos trabalhadores experientes.

Com a parcela de empresas relatando falta de pessoal atingindo 77%, há uma lacuna significativa entre os empregos disponíveis e os trabalhadores desempregados nos Estados Unidos. A cada dia, 10.000 americanos atingem a idade tradicional de aposentadoria, o que pode resultar na perda de habilidades críticas, experiência e conexões.


No entanto, muitos trabalhadores mais velhos desejam continuar trabalhando durante a aposentadoria, com cerca de 60% deles receptivos à ideia.


O artigo argumenta que as empresas precisam parar de ignorar esse grande grupo de trabalhadores valiosos e adotar medidas para aproveitar sua experiência. Isso inclui a criação de programas de aposentadoria gradual, oferecendo cursos de atualização e recrutando através de redes de aposentados, entre outras estratégias.


A experiência dos trabalhadores mais velhos pode ser aproveitada através de papéis de coaching, equipes multigeracionais e sistemas institucionais, mas as empresas precisarão se esforçar para envolver esses funcionários experientes, oferecendo flexibilidade, benefícios adequados e oportunidades de conexão.


No Brasil, penso que não só as empresas, mas a própria legislação deveria se mexer para oferecer maior liberdade de formatos e modelos de trabalho entre empresas e trabalhadores...


Assunto mais quente: Inteligência artificial


O tema do momento aparece diretamente em 5 artigos...


Um deles é um gráfico interessante (“the great migration”), que mostra que, desde 2021, as grandes empresas americanas de tecnologia atacaram os bancos e tiraram boa parte dos seus executivos de inteligência artificial. Amazon, Google, Microsoft e Meta limparam as áreas de AI do JPMorgan, Goldman e Bank of America. Provavelmente na época foi visto como um movimento muito caro, mas veja o que aconteceu com o valor dessas empresas!


“Não deixe a inteligência artificial minar a criatividade do seu time”. Artigo trouxe um estudo muito interessante: um pesquisador fez um experimento nos EUA e Europa, em que problemas de negócios foram dados para dois times da mesma empresa: um time 100% humano e outro de humanos usando AI. As ideias geradas foram então qualificadas em notas.


O resultado foi surpreendente. O uso de AI gerou mais ideais medianas, ou seja, não trouxe ideias estapafúrdias, mas tampouco as melhores.


A conclusão do artigo é que o uso de AI ainda deve ser visto como um PARCEIRO de conversas estruturadas e que nós, humanos, ainda temos muito a aprender para aproveitar essa tecnologia.


“Traga valores humanos para a inteligência artificial”. AI focou até hoje em melhorar eficiência e performance, mas os resultados podem ser imprevisíveis, ofensivos e perigosos. Os autores elencam 6 desafios aqui envolvidos, muito focados em valores. Talvez por não ser o meu universo, achei meio “espuma” para vender palestra e livro.

Outros dois artigos focam nas aplicações de AI nas máquinas pesadas e em supply chain. O mais interessante é que são assinados por indianos ligados à grandes universidades americanas, o que mostra a transformação que está acontecendo naquele país.

Outros temas relevantes:


Gestão da autoimagem. Um breve artigo me chamou a atenção, pois é um tema que tem surgido em mentorados: como devo gerenciar a minha autopromoção? Meu chefe me cobra de aparecer mais em redes sociais, mas eu não quero. O que fazer? Voltarei ao tema em artigo futuro.

ESG perdeu os holofotes? As 3 letrinhas só aparecem uma vez, em 160 densas páginas. Por curiosidade, peguei uma edição do final de 2022 e o termo ESG apareceu 59 vezes. Na única aparição de agora, há um artigo que oferece orientação para executivos sobre como lidar com questões sociais, defendendo uma abordagem baseada em dados e sensível a valores e contexto para determinar quais questões abordar e como abordá-las, gerenciando possíveis repercussões negativas e conflitos de interesses.


Uma visão mais realista do marketing de produtos sustentáveis. Muitas empresas superestimam o apetite dos clientes por produtos sustentáveis, inundando o mercado com ofertas que não vendem. A realidade é que os benefícios sociais e ambientais têm menos impacto nas decisões de compra do que os atributos básicos do produto. Os consumidores compram produtos para realizar tarefas específicas e só depois procuram por produtos que ofereçam alguma vantagem social ou ambiental. É preciso considerar como os benefícios dos produtos sustentáveis interagem com os benefícios tradicionais. Gostei do artigo pois escrevi aqui, no auge dos discursos politizados sobre o tema em 2021, que quem definiria o valor da sustentabilidade seria o mercado, e está aí Harvard dizendo, o mercado ainda não foi convencido.


O gigante enrosco da saúde. O mundo tem dois problemas insolúveis e que só vão piorar com o tempo: saúde e previdência (isso é observação minha, não de Harvard). A edição traz uma possível alternativa ao caso da saúde, sugerindo que parcerias entre varejistas e sistemas de saúde podem abordar desafios como custos crescentes, qualidade inconsistente e acesso desigual aos cuidados de saúde. Propõe a expansão dos cuidados oferecidos, levando-os para além das clínicas, utilizando dados para melhorar a experiência do cliente e alterando como e por quem os cuidados de saúde são fornecidos.

Encerro com uma lista de provocações para você e sua empresa.


  1. Você já parou para questionar se o desejo de crescimento da sua empresa é genuíno e realista, ou apenas uma corrida atrás de um ideal inatingível? E, mais importante ainda, há um trajeto crível para conquistar esse crescimento, ou apenas um percentual em uma planilha que aceita tudo?

  2. E o seu desejo de crescimento de carreira? Vale a mesma reflexão.

  3. Enquanto o envelhecimento da força de trabalho não é novidade, muitas empresas parecem apenas fingir preocupação com essa questão para manter uma imagem positiva. No entanto, será que subestimam o verdadeiro potencial por trás desse fenômeno? Será que pensar em formas alternativas de contratação de mão de obra mais velha pode ser mais do que apenas uma estratégia de relações públicas, ou o esforço não compensa?

  4. Tantos artigos sobre inteligência artificial indicam que é mais um assunto da moda, criado para vender consultoria e palestras e que vai esfriar em 2 ou 3 anos, ou esse é o da moda que veio para mudar tudo?

  5. A redução drástica de temas ligados a ESG representa que o assunto perdeu força, ou é uma coincidência em uma publicação isolada?

  6. Tantos artigos sobre inteligência artificial indicam que é mais um assunto da moda, criado para vender consultoria e palestras e que vai esfriar em 2 ou 3 anos, ou dessa vez o assunto da moda veio para ficar?


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