Renner, a empresa brasileira do ano, é uma aula para empresas familiares!
- Gustavo Sette
- 20 de ago. de 2018
- 3 min de leitura
Está nas bancas o sempre imperdível anuário Melhores & Maiores da Exame, e a Renner foi eleita a empresa do ano.
Parece ter sido uma escolha justa, tendo em vista resultados tão consistentes e espetaculares nesse momento do país. A empresa fechou 2017 com lucro de 221 milhões de dólares, 14% acima do ano anterior, 70 novas lojas abertas e 2000 empregos criados. Nos últimos 5 anos, suas vendas cresceram 40% (e o setor caiu 4%).

Antônio Jacob Renner fundou a empresa em 1912, em Porto Alegre, e a 1ª loja foi inaugurada em 1922. Ainda como empresa familiar, Cristiano Renner, o neto do fundador (portanto, 3ª geração), contratou um consultor chamado José Galló para fazer um trabalho de 90 dias. Isso foi em 1991, e o “consultor” está lá até hoje, como presidente.
Em 1998, Galló levou à família Renner um plano para expandir a empresa gaúcha para todo o Brasil, mediante um investimento de U$ 100 milhões. A família gostou, mas não quis fazer o cheque sozinha. Galló então foi atrás de um investidor, e a gigantesca americana JCPenney entrou e… Comprou 100% da Renner! A família diz que a proposta foi irrecusável.
Em 2005, a JCPenney resolveu sair da América Latina e, na falta de um comprador, a alternativa foi ofertar os 98% da Renner a mercado, criando a primeira “Corporation” brasileira (uma empresa com capital pulverizado e sem um dono ou controlador predominante).
Há farto material escrito sobre o estilo de gestão de José Galló: disciplina, controle, conservadorismo, proximidade da ponta, discrição, simplicidade e foco na empresa, e não em fazer confete de si próprio.
Para as empresas familiares, fica uma bela lição do que é, de fato, profissionalização.
É natural imaginar que, em 27 anos de comando, Galló tenha cometido erros enormes, passado anos sem bater metas, apostado em pessoas e projetos que não deram certo, mas a continuidade do trabalho com a pessoa certa geralmente leva ao sucesso.
Em muitas famílias empresárias, os erros são ressignificados e misturados com emoções familiares. “Ele errou de novo, eu avisei, temos que mudar, desde a escola ele faz essas coisas, você deu poder demais a ele”.
Outro problema que acontece muito é justamente o contrário: o perigo que um executivo capacitado representa a quem está no comando. Ao surgir um sucessor preparado, o fundador ou chefe atual percebe a ameaça e encontra um jeito de “se livrar” do problema.
Outra armadilha em famílias empresárias é a vaidade. Muitos sucessores, ao se tornarem donos, não conseguem ver outro executivo fazendo sucesso, e logo dão um jeito de assumir o seu lugar. Para piorar, sentem-se obrigados a mudar tudo, inclusive o que estava funcionando (leia o que escrevi semana passada sobre a Editora Abril após a morte de Roberto Civita).
Muitas empresas agem como times de futebol – perde 3 jogos, aciona-se um botão “muda o técnico”. Mas, os grandes times de qualquer época surgiram só após trabalhos consistentes e duradouros.
O desafio atual para a Renner e para Galló é comum às empresas familiares: a sucessão, mas até nesse ponto eles parecem estar em outro patamar. O executivo tem 66 anos e, em conferência recente, garantiu que sairá da presidência até o final desse ano e, mais do que isso, que o processo sucessório está acontecendo há 5 anos!
Não me atrevo a comentar varejo de moda, mas em termos de empresa familiar, gestão, governança e cultura, a Renner parece ser uma empresa como aquele aluno que não falta às aulas, lê o que o professor recomenda, faz as lições, estuda, tira as dúvidas, ajuda os colegas, faz os trabalhos e se prepara para as provas. Ou seja, obtém sucesso não por inventar algo espetacular, mas sim por fazer com disciplina aquilo que todo mundo sabe que funciona, mas não faz.
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