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  • Gustavo Sette

Quando empresas familiares demitem executivos de mercado, quem errou mais?

Um enredo clássico em empresas familiares, exemplificado pela matéria abaixo: a família decidiu profissionalizar a gestão.





Para isso, fez um plano de reformulação e trouxe nomes conceituados de grandes empresas do setor tanto para cargos executivos quanto para o conselho, mas todos os outsiders foram demitidos e a família retomou a liderança da empresa e do conselho. Os executivos foram para posições de peso em empresas concorrentes.


Vamos comentar o caso sem discutir a família mencionada no artigo, afinal, não se deve tirar conclusões nem tomar partido em assuntos de empresas sem um diagnóstico em que se ouça os diversos lados envolvidos. Além disso, essas mesmas coisas acontecem tanto que não precisamos falar de uma família específica. Para cada empresa grande que vive uma história que vai parar nos jornais, milhares de empresas médias e pequenas viveram variações do mesmo tema.


Vamos dividir os erros clássicos dessa história em erros da família empresária e erros dos executivos de fora da família.


Um primeiro erro da família gira em torno da mística palavra “profissionalização”. Pergunte a 10 executivos, consultores ou fundadores o que significa profissionalizar e não se surpreenda se receber 10 respostas diferentes. Mais do que isso, o que a família QUER, o que DESEJA com o processo de profissionalizar? É sempre bom começar por aí.


Um segundo erro é a expectativa irracional de querer controlar tudo: planejamento, execução e resultados. O processo de planejamento e delegação tem como premissa renunciar a parte do controle, mas muitas famílias querem gestores de mercado, que executem com sucesso as ideias da família, da forma que a família quer e que tudo dê certo sem desvios. É como contratar um treinador de futebol que só pode ganhar o campeonato com um gol de falta do camisa 10 aos 30 minutos do segundo tempo. Se ganhar de outra forma, não vale.


Um terceiro erro é o processo de planejamento feito a portas fechadas, sem o envolvimento de quem vai colocar a mão na massa e sem a devida visão do mundo externo. A situação é ainda pior quando acontece algo como o relatado no artigo: a família faz o plano sozinha e contrata executivos de fora para executar sem terem participado da elaboração, o que leva ao maior e mais comum dos erros...


O pior dos erros é sacrificar a empresa em benefício do próprio ego. Querendo provar que são pessoas indispensáveis e líderes memoráveis, muitas famílias criam planos fadados ao fracasso para encenar um retorno teatral, triunfal e salvador. As duas modalidades mais comuns são (1) cercar a empresa de executivos despreparados e (2) trazer gente boa, mas sabotar a gestão. Um exemplo contemporâneo é Howard Schulz, fundador do Starbucks e que está, nesse momento, no TERCEIRO retorno triunfal ao cargo de CEO (e já está falando DE NOVO que a empresa precisa de um CEO de fora).


Falando agora dos erros cometidos pelos executivos.


O primeiro e maior erro dos executivos é ignorar a complexidade das empresas familiares. Você já deve ter visto executivos do setor privado comentando como é difícil e diferente trabalhar para o setor público... Por que será que muitos ignoram a complexidade das empresas familiares? Há a dinâmica da família, muita mensagem truncada, diferentes agendas e muito jogo de bastidores, mas o executivo de multinacional acha que já viu de tudo e que vai tirar de letra. Isso vale para fundos de private equity que investem em empresas familiares, e eu mesmo já defendi essa tese para alguns gestores de fundo: o executivo que vai sentar lá pode ter 20 anos de sucesso na Unilever ou na McKinsey, mas precisa de ajuda para lidar com esse novo cenário.


Um segundo erro dos executivos é não fazer uma boa pesquisa antes de aceitar o desafio. É preciso fazer as perguntas certas e um bom mapeamento de cenário. Outro erro grave é assumir um planejamento sem ter participado de sua elaboração. Cometi um erro semelhante quando eu tinha uns 30 anos: assumi um projeto impossível sem ter feito as perguntas certas a um diretor que não tinha nada a perder: se desse certo, ótimo. Se desse errado, ele mesmo já não contava com aqueles números. Quem errou? Eu, claro.


Um terceiro erro é não perceber que se está jogando outro esporte. Corrida de 100 metros rasos é uma coisa, maratona é outra, embora ambos sejam corrida. O executivo que vai para uma empresa familiar é exposto a novos patamares de triangulação, com familiares e executivos tentando passar recados e movimentar os seus diferentes tabuleiros. Outro erro comum é não perceber a origem do poder.


Um quarto erro é dar mais importância ao que é falado do que ao que é feito. Em algumas áreas, e empresa familiares estão entre elas, as palavras valem pouco, o que importa são os atos. Executivos não podem cair em armadilhas clássicas como, “o fundador já se afastou do dia a dia”, ou então, “a esposa do dono não se envolve nos negócios”. E quando uma empresa familiar é comprada e o antigo controlador passa a ser minoritário? “Ele não tem mais o controle e está se afastando da gestão”. Erro clássico de executivos e investidores.


Um erro que não é erro, mas sim premeditação. Uma coisa que acontece muito é um executivo aceitar um emprego em uma empresa familiar com intenções de ficar pouco tempo, só para não ficar parado. O setor que ele domina pode estar em crise, ou a vaga que ele já combinou com outra empresa só vai ser liberada no ano que vem, ou ele está cumprindo alguma espécie de quarentena remunerada. Nesse caso, ele até enxerga os erros acima, mas concorda com tudo para ganhar tempo – e dinheiro. Quem erra aqui é a empresa, que fica empolgada com um executivo que concorda com tudo sem fazer a correta leitura do cenário.


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Os erros aqui listados são apenas alguns exemplos de uma lista que poderia ir longe, mas concluo o artigo com a pergunta do título: nessa dança circular entre trazer executivos de fora versus a família voltar ao poder, quem comete mais erros, o executivo ou a família dona da empresa?


Tendo a achar que, de forma geral, a empresa atrapalha-se mais e tem mais a perder. Um executivo que sabe cuidar da própria carreira e de suas finanças pode rapidamente se recolocar, sem grandes prejuízos, e não terá dificuldades para explicar o que deu errado ao novo chefe em potencial – “empresa familiar, dono e família não me deixaram trabalhar, você sabe como essas coisas funcionam”.


A empresa tem mais riscos e mais danos. Os concorrentes avançam, os BONS funcionários saem, o executivo que ficou pouco tempo leva informações aos concorrentes e as disputas familiares se intensificam, com os tradicionais “eu avisei”, “a culpa foi sua” e ‘se tivessem feito como eu falei...”.


Sei que falarei em causa própria, mas assumindo aqui o conflito de interesses, todos os riscos aqui discutidos podem ser reduzidos drasticamente com o trabalho de um especialista.


Alguns exemplos: o que a família quer com a tal da profissionalização? Quer fazer um planejamento estratégico realista? Quer contratar um executivo capaz de navegar pela dinâmica da família, ou quer ajudar esse executivo em sua missão?


Executivos também podem ser ajudados em todas as etapas, desde o processo seletivo até como se comportar no casamento da filha do dono da empresa... Você pode ser colocado na cadeira ao lado da mãe do homem que criou tudo, mas fique tranquilo, pois todo mundo já te disse que ela não trabalha na empresa e, portanto, não tem nenhuma influência no seu trabalho.


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