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Liderança compartilhada entre irmãos: é raro, mas pode dar certo

  • Gustavo Sette
  • 2 de mai. de 2018
  • 5 min de leitura

Resumo: a rivalidade entre irmãos é um tema clássico da psicologia e com fortes impactos nas empresas familiares. Para que irmãos liderem uma empresa em parceria, algumas condições raras e improváveis precisam estar presentes. O artigo enumera essas condições usando um caso real como exemplo, mostrando como funciona o trabalho de consultoria.


Gustavo Sette. 02/05/2018





O caso


Trabalhei recentemente com uma empresa que me colocou um dilema interessante: o marido acreditava que os três filhos poderiam liderar a empresa de forma partilhada, mas sua esposa dizia que isso seria impossível. Não conseguindo chegar a um acordo, o casal me procurou para ouvir uma opinião de fora.


O par de donos estava muito preocupado com a questão, com os 4 anos que já haviam investido discutindo isso e quantas horas de consultoria e análises eu precisaria para dar uma opinião.


Eu pedi uma semana para dar uma resposta fundamentada, desde que pudesse falar por no máximo uma hora com eles dois, com os três filhos, seus cônjuges e um ou dois funcionários da empresa da família.



A teoria sobre o assunto


Irmãos dividindo poder, pode dar certo?


A questão já é complexa sem misturar irmãos. Pegue as instituições que você conhece que têm o desafio de juntar pessoas em prol de um objetivo: empresas, exércitos, igrejas, governos, associações de classe e outras. Quantas delas adotam uma estrutura de poder compartilhado? São raríssimas.


Por algumas razões que não são alvo desse artigo, a imensa maioria das organizações decidiu que é melhor ter uma pessoa no comando.

Claro que o estilo de liderança muda – mais participativa, mais autoritária, mas o modelo é quase sempre o mesmo.


Irmãos trabalhando juntos, dividindo o poder em harmonia, pode dar certo desde que algumas condições muito raras estejam presentes. Vamos explorar algumas:


  1. Os irmãos devem ter competências complementares, até mesmo para não entrarem em rota de colisão. Conheço uma empresa de saúde animal no interior de SP em que um irmão é muito experiente em finanças e o outro é veterinário e cuida da parte técnica, ambos muito bem formados e com carreiras consolidadas fora da empresa da família. Nesse caso, se completam.

  2. Reconhecem a rivalidade natural entre irmãos e encontraram uma forma de apaziguar os impactos dessa característica da relação. Pode ser um pouco de bom humor, algum método para lavar roupa suja, ou mesmo eleger um árbitro, um conselheiro de fora para atuar quando se chega a um impasse.

  3. Estilos compatíveis de comunicação e relacionamento – conseguem dialogar e se resolver em conversas diretas, sem usar triangulações e intermediários.

  4. Têm uma rede de influenciadores favorável, que ajuda ou, pelo menos, não atrapalha. Em outras palavras, maridos ou esposas compartilham a visão, entendem que a harmonia é importante e usam a sua influência em prol do entendimento.

  5. Enxergam-se como um time, ou seja, querem o melhor para a empresa e para a família. Não discutem quem é melhor ou pior, quem acertou ou errou. Não seguem o estereótipo “eu ganho, nós empatamos, vocês perdem”.


E agora, vamos às duas características mais importantes.


  1. Visão compartilhada de objetivos. Os irmãos dividem os mesmos interesses e desejos para o futuro, e esses desejos não são na 1ª pessoa do singular. “EU quero atingir isso” não funciona em divisão de poder.

  2. Estão juntos por escolha pessoal. Gostam de estar juntos, a convivência é amigável, gostam de ver o sucesso um do outro e, acima de tudo, estão juntos por escolha pessoal, não por necessidade e nem por imposição dos pais ou da situação.


A teoria aplicada ao caso


A questão dos meus clientes foi respondida em 4 dias. Para variar, a esposa tinha razão: não havia condições de aqueles irmãos trabalharem juntos. A eventual parceria não passou pelo teste em quase nenhum dos requisitos.

Resumo do diagnóstico:

  1. Não haviam competências complementares, dois irmãos eram totalmente comerciais e o outro ainda tinha um perfil indefinido, um pouco perdido na carreira.

  2. Não havia consciência e nem aceitação de que existe rivalidade entre irmãos, um tema bastante esclarecido na psicologia. Nasce um irmão, o mais velho associa aquilo à perda e nasce raiva, ciúmes e uma disputa incessante pela atenção dos pais, que não termina com a idade adulta. Parte da família achava que a relação entre irmãos é como qualquer outra.

  3. Não havia uma boa dinâmica de comunicação e solução de conflitos. Um dos irmãos era duro e direto demais com os outros, e um dos irmãos utilizava o pai nos conflitos, a chamada “triangulação”.

  4. A rede de maridos / esposas não era nada favorável. As aspirações não convergiam para o entendimento, mas sim para provar que quem merecia a presidência era a pessoa X / Y.

  5. A visão de futuro não buscava objetivos em comum. Havia um lado de crescimento muito agressivo, outro de manter um bom nível de vida a todos, mas evitar grandes riscos, e um muito focado no “eu”, ou seja, nos objetivos pessoais.

  6. Estar junto não era uma escolha pessoal, longe disso. Surgia como um mal necessário, um desejo do pai e a única forma de ficar na empresa da família.

Os próximos passos


O que eu mais gostei na apresentação do resultado é que em nenhum momento a esposa disse ao marido, “está vendo? Eu avisei”. Fomos direto à busca por uma solução.


Como passo seguinte, avaliamos a situação de cada um. Conversando de forma aberta e franca com cada herdeiro, após algumas semanas foi decidido que:

  1. Um dos filhos, que tem experiência relevante em outras empresas, assumirá uma gerência geral tendo os pais como mentores por 3 anos, mas deve cumprir um plano de desenvolvimento pessoal, que inclui coaching profissional, estudos e o alcance de alguns resultados.

  2. Um dos filhos sonhava em estudar fora do Brasil. Dessa forma, decidiu-se que ele iria se afastar agora para estudar nos EUA patrocinado pela empresa da família. Lá ele deverá trabalhar em outra empresa e, em cerca de 5 anos, uma nova avaliação será feita. A tendência é que ele volte como um profissional gabaritado a assumir posições importantes em outras empresas. Se nessa nova condição ele e o irmão decidirem que querem trabalhar juntos, aí será uma decisão com grandes chances de dar certo.

  3. Um dos filhos vai se retirar da empresa para dedicar-se à sua verdadeira paixão, que não é ligada ao mundo dos negócios. Ele receberá uma remuneração mensal garantida e, para isso, abre mão das ações da empresa como herdeiro. Isso foi formalizado em um contrato de herdeiros, que foi assinado por filhos e cônjuges.


O trabalho de consultoria


Acho que muitos consultores gostam mais do próprio método do que de atender ao desejo dos clientes. Não fiz um diagnóstico completo de todo o sistema familiar porque o cliente não pediu e não me pareceu necessário para responder à inquietação que eles trouxeram.


Acredito que clientes de consultoria querem uma solução rápida, de forma que cobrar consultoria por hora e impor etapas independentemente do tipo de serviço é um problema ético – quanto mais demorar, melhor para… O consultor. Nesse caso, acabamos fazendo vários trabalhos juntos, mas cada um sempre foi limitado a um escopo reduzido e previamente delimitado


Vale reforçar que esse artigo foi autorizado e validado pela família que aqui foi retratada.



Rivalidade entre irmãos


Nesse caso específico, os irmãos acharam melhor se separar, mas a relação entre irmãos existe em muitas empresas e há uma série de técnicas e conceitos que devem ser usados para que essa junção dê certo.

O tema é apaixonante e certamente voltaremos a ele.


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